Olá OABeiros de plantão!
Tudo bom com vocês?
Hoje iremos tratar da peça mais cobrada na 2ª fase da OAB em Direito Penal dos últimos tempos: a apelação!
Ensinaremos na prática a estrutura e ainda colocaremos uma questão simulada com resposta e aprofundamento para que você fiquem confiantes para elaborar uma excelente apelação e atingir sua aprovação no exame da OAB. Vamos em frente!
- Recorrência das peças na OAB.
Dessa maneira iremos ensiná-los a elaborar a peça mais importante da sua preparação.
Nada melhor do que aprender a fazer na prática essa peça, por isso estamos disponibilizando para vocês uma questão simulada com padrão de respostas e aprofundamento. Fiquem à vontade para fazer primeiro a questão e depois verificar a resposta e o comentário. Lembre-se de simular o tempo que teria na prova.
2. Caso prático
Sebastião, nascido em 19/05/1999, atualmente desempregado, casou-se com Ana Lúcia, contudo, em virtude de um atropelamento acabou perdendo sua esposa. Sebastião nunca teve qualquer problema que seja com a justiça ou a polícia.
Do relacionamento, nasceu Bianca, a qual tem 2 (dois) anos de idade. Aliado ao fato de ter perdido a esposa, Sebastião acabou de ser despedido do seu último emprego.
Bianca é portadora de uma doença em que não pode ingerir leite comum e, por isso, precisa tomar determinado remédio. Ao ver a filha começando a apresentar problemas de saúde pela ausência do leite, Sebastião busca conseguir ajuda para comprar o remédio. No entanto, não consegue essa ajuda.
Em ato de desespero, Sebastião vai à noite, na Farmácia Pague Mais, a qual funciona 24h, e subtrai o remédio de que Bianca precisa. Contudo, Sebastião é perseguido pelos seguranças da farmácia e, em seguida, preso.
Sebastião foi denunciado pelo Ministério Público pelo crime de furto majorado, nos termos do artigo 155, caput do Código Penal.
Após o devido processo legal, o juiz da 10ª Vara Criminal da cidade de Bacabal no Estado do Maranhão proferiu sentença em que condena Sebastião a pena de 4 (quatro) anos e, ainda, pena de multa.
O juiz considerou todos os argumentos da acusação, sobretudo, na dosimetria da pena.
A sentença foi publicada em 17/05/2020.
Diante dos fatos apresentados, redija a peça cabível apresentando os argumentos possíveis para a defesa de Sebastião. Ao final, apresente a data da peça no último dia do prazo.
3. Resposta ideal
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 10 a VARA CRIMINAL DA COMARCA DE BACABAL – MARANHÃO
SEBASTIÃO, já devidamente qualificado, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, por intermédio de seu procurador infra-assinado, que, não se conformando, data venia, com a sentença proferida, interpor
RECURSO DE APELAÇÃO,
Com fulcro no art. 593, I, do Código de Processo Penal brasileiro, dentro do quinquídio legal, juntando as razões de apelação e requerendo o preparo dos autos, que uma vez concluído deve ser remetido ao Tribunal competente.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
Local, 24 de maio de 2019.
ADVOGADO…
OAB no…
RAZÕES DE APELAÇÃO
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO
COLENDA CÂMARA,
ÍNCLITOS JULGADORES,
Em que pese o virtuoso saber jurídico do MM Juiz de 1o grau, impõe-se a reforma da respeitável sentença proferida contra o apelante, pelas razões a seguir aduzidas:
1. DA BREVE SÍNTESE DOS FATOS
O réu condenado, Sebastião, nasceu em 19/05/1999, atualmente desempregado, casou-se com Ana Lúcia, contudo, em virtude de um atropelamento acabou perdendo sua esposa. Sebastião nunca teve qualquer problema que seja com a justiça ou a polícia. Do relacionamento com Ana, nasceu Bianca, que tem 2 (dois) anos de idade. Aliado ao fato de ter perdido a esposa, Sebastião acabou de ser despedido do seu último emprego.
A filha do réu é portadora de uma doença em que não pode ingerir leite comum e, por isso, precisa tomar determinado remédio. Ao ver a filha começando a apresentar problemas de saúde pela ausência do leite, Sebastião buscou conseguir ajuda para comprar o remédio. No entanto, não consegue essa ajuda. Em ato de desespero, Sebastião foi durante a noite até Farmácia Pague Mais, a qual funciona 24h, e subtraiu o remédio de que Bianca precisava. O ora condenado foi levado à delegacia. Posteriormente, fora denunciado como incurso no crime de furto majorado, nos termos do artigo 155, §1o do CP.
Após o devido processo legal, o juiz da 10a Vara Criminal da cidade de Bacabal no Estado do Maranhão proferiu sentença em que condena Sebastião a pena de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses e, ainda, pena de multa. O juiz considerou todos os argumentos da acusação, sobretudo, na dosimetria da pena. A sentença foi publicada em 17/05/2019 (sexta-feira).
2. DO DIREITO
Inicialmente, cumpre ressaltar que o réu não poderia ter sido condenado pelo crime de furto majorado em virtude da existência de manifesta causa de exclusão de ilicitude, qual seja, o estado de necessidade. Prevê o Art. 24 do Código Penal que atua em estado de necessidade aquele que pratica fato descrito como crime para salvar de perigo atual, que não causou por sua conduta, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício não era razoável exigir naquelas circunstâncias.
Claramente, Sebastião estava com o direito de sua filha em situação de risco atual e concreto, em especial porque a criança estava ficando doente em razão da ausência do consumo de leite, que só tornar-se-ia possível mediante o uso do remédio.
Ademais, a situação de perigo não fora por ele criado, já que perdeu a esposa, o emprego e ainda buscou ajuda, porém não obteve êxito. Por fim, não era razoável exigir que Sebastião sacrificasse a integridade física de sua filha em detrimento de lesão de ínfimo valor para a referida Farmácia. Logo, deve ser absolvido, nos termos do artigo 386, inciso III do Código de Processo Penal. Em virtude do princípio da eventualidade, caso não seja do entendimento de vossas excelências da aplicação da referida causa excludente da ilicitude, que seja observada a tese subsidiária a seguir exposta.
Sebastião faz jus a circunstância atenuante prevista no artigo 65, inciso I do Código Penal brasileiro, visto que tem 20 anos de idade. Contudo, o MM. Juiz não observou tal possibilidade quando fez a dosimetria da pena, o que constitui em grave injustiça contra o réu. Além disso, o mesmo é réu primário, logo, a pena-base deve ser arbitrada no mínimo legal. Assim, caso a Colenda Turma entenda pela condenação do réu, o mesmo faz jus a correta observação das mencionadas informações na dosimetria da pena.
3. DO PEDIDO
Considerando, o que foi acima disposto, mediante os fatos e fundamentos jurídicos apresentados, o réu requer seja:
a) Recebida e provido o presente recurso de apelação;
b) Modificada in totun a SENTENÇA, do Juiz de primeiro grau, absolvendo o suplicante, nos termos do art. 386, III, do CPP, visto que o fato típico foi praticado em estado de necessidade, nos termos do artigo 24 do CP. Assim, merece ser absolvido, por ser medida que se adequa aos nobres ideais de JUSTIÇA.
c) Em não sendo este o entendimento desta Colenda Turma, que ao réu seja reconhecida a atenuante de menoridade relativa, bem como a pena seja aplicada no mínimo legal, visto que as circunstâncias lhe são favoráveis;
d) Que o Ministério Público seja intimado no prazo legal para apresentar suas contrarrazões.
Nesses Termos, pede Deferimento.
Local, 24 de Maio de 2019.
ADVOGADO…
OAB no…
4. Comentários
Segundo lição de Renato Brasileiro (2016), a apelação é tratada pela doutrina como recurso ordinário por excelência, já que consiste na impugnação de efeito devolutivo mais amplo, por permitir ao juízo ad quem, quando ela for interposta contra sentença de mérito proferida por juiz singular, o reexame integral das questões suscitadas no primeiro grau de jurisdição, ressalvadas aquelas sobre as quais tenha se operado a preclusão (v.g., nulidade relativa não arguida oportunamente).
Funciona como eficaz instrumento processual para concretização do princípio do duplo grau de jurisdição, visto que, em face do extenso âmbito cognitivo do julgado recorrido, permite que o juízo ad quem reaprecie questões de fato e de direito. O prazo para interposição da apelação é de 05 dias. A apelação é um recurso de peça dupla, isto é, deverá ser apresentada uma peça de interposição e outra com as razões.
Nas palavras de Norberto Avena (2017), a apelação de sentenças definitivas de condenação ou de absolvição encontram-se em extremo completamente oposto aos despachos de mero expediente, revestindo-se de carga decisória e pondo termo ao processo no momento adequado, vale dizer, depois de cumpridas todas as etapas procedimentais previstas em lei.
No caso em tela, a decisão proferida pelo juiz singular declarou a culpabilidade do acusado e lhe impôs uma determinada sanção penal. O recurso cabível contra essa espécie de decisão será, em regra, a apelação (art. 593, I, do CPP), ressalvando-se apenas a hipótese de julgamento do réu pela prática de crime político, assim considerado aquele que preenche os pressupostos inscritos no art. 2.o da Lei 7.170/1983 (Lei de Segurança Nacional): motivação política e lesão real ou potencial aos bens juridicamente tutelados.
Na situação apresentada, o acusado praticou o crime em estado de necessidade, que constitui uma causa excludente de ilicitude. O estado de necessidade vem previsto no art. 24, caput, do Código Penal:
Art. 24. Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.
Claramente, o acusado agiu em estado de necessidade. A sua filha, Bianca, enfrentava perigo atual, visto que ainda está nos primeiros anos de vida e poderia ficar sem um alimento de extrema importância nessa fase da vida como é o leite. Além disso, Sebastião não provocou tal fato, visto que a filha nasceu com o problema.
O artigo 24 do CP garante que o agente pode agir para evitar lesão a bem jurídico seu (estado de necessidade próprio) ou de terceiro (estado de necessidade de terceiro), não sendo necessário qualquer tipo de relação entre eles. Como lembra Rogério Sanches Cunha (2016), a conduta humana formal e materialmente típica é somente indício de ilicitude, que pode ser excluída diante da prova (ou fundada dúvida) da presença de alguma causa excludente da antijuridicidade. Essas causas estão previstas, principalmente (e não exclusivamente), na Parte Geral do Código Penal, mais precisamente no seu artigo 23, que anuncia:
“não há crime quando o agente pratica o fato:
I – em estado de necessidade;
II – em legítima defesa;
III- em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito”.
Logo, também não houve crime, em virtude da excludente de ilicitude mencionada e, por isso, Sebastião deve ser absolvido, nos termos do artigo 386, III do Código de Processo Penal. Ainda, em virtude do princípio da eventualidade, deve-se alegar, também, algumas teses subsidiárias:
A pena-base deve ser fixada no mínimo legal, nos termos do artigo 59 do Código Penal. Ainda que seja reconhecida a atenuante prevista no artigo 65, inciso I do Código Penal, isto é, a da menoridade relativa. Conforme Cleber Masson (2018), menoridade relativa é a atenuante genérica aplicável aos réus menores de 21 anos ao tempo do fato, pouco importando a data da sentença. Devem ser maiores de 18 anos, independente de eventual emancipação civil, pois do contrário incidem as regras do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.
No caso em tela, Sebastião nasceu em 1999, portanto, tem 20 (vinte) anos, fazendo jus a referida circunstância atenuante, a qual não foi devidamente observada.
Todas as alegações feitas ao longo da peça devem ser devidamente observadas e feitas em sede dos pedidos, visto que esta é a parte em que o juiz da causa irá se ater para atender ou não aos requerimentos feitos com base nos fatos e fundamentos apresentados. Na apelação, ainda é importante o pedido de provimento do recurso.
Por fim, vale mencionar que a peça deve ser datada em 24 de maio de 2019, visto que a sentença foi publicada em 17 de maio de 2019, uma sexta-feira. Como o prazo se inicia no próximo dia útil, o mesmo passou a contar da segunda-feira, dia 20 de maio de 2019.
DICA DE LEITURA: CARVALHO, Thiago Amorim dos Reis. Furto famélico, estado de necessidade, crime impossível e princípio da insignificância: até quando o delegado de polícia continuará a ser uma autoridade simbólica?. Conteudo Juridico, Brasilia- DF: 25 jun. 2009. Acesso em: julho de 2019.
5. Conclusão
Então, OABeiros. Gostaram da questão e das dicas?
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